26 outubro 2015

A encruzilhada da Frelimo e de Nyusi: entre dominação e direcção [28]

Quanto mais os gestores de um Estado investirem nos aparelhos repressivos e na repressão, mais alta será a composição orgânica da política e menor a taxa de lucro político, quer dizer, menor a legitimidade.
Vigésimo oitavo número da série. Sempre com hipóteses, prossigo o sétimo e último ponto sugerido no sumário aqui, a saber: 6. Modo de produção e de reprodução do social. Aí, finalmente, em toda a sua complexidade, habita a luta entre concepções de dominação e de direcção política. Nesse sentido, vale certamente a pena recordar Eduardo Mondlane, em toda a sua permanente modernidade.
Na verdade, foi ele quem, melhor do que ninguém, enunciou no país os termos da troca política, da justiça social e, afinal, da democracia real: os cidadãos só participam num projecto político se o Estado for um parceiro redistribuidor. É por essa via que se adquire legitimidade, é por aí que verdadeiramente toma corpo a direcção política. Na verdade, a Frelimo enfrentou nos anos 64/66, os dois primeiros da luta armada, o seguinte problema, narrado por Mondlane:
O vazio deixado pela destruição da situação colonial pôs um problema prático que nunca tinha sido considerado pelos chefes: o desaparecimento duma série de serviços inerentes à dominação portuguesa, especialmente serviços comerciais, enquanto o povo continuava a existir e a necessitar deles. A incapacidade da administração colonial deixava também muitas necessidades insatisfeitas, que continuavam a ser fortemente sentidas pelas populações. Assim, desde as primeiras vitórias de guerra, recaíam sobre a FRELIMO muitas e variadas responsabilidades administrativas. Uma população de 800 000 habitantes tinha de ser servida. Primeiro e acima de tudo, havia que satisfazer as suas necessidades materiais, assegurar abastecimentos alimentares, e outros artigos, como vestuário, sabão e fósforos; serviços de saúde e educação, sistemas administrativos e judiciais. [Durante algum tempo, o problema foi agudo. Não estávamos preparados para o trabalho que tínhamos pela frente, e faltava-nos experiência na maioria dos campos em que necessitávamos dela. Nalgumas áreas, as carências eram muito sérias; e onde os camponeses não compreendiam as razões, retiravam o seu apoio à luta e, nalguns casos, partiam mesmo definitivamente.” [Mondlane, Eduardo, Lutar por Moçambique. Lisboa: Sá da Costa, 1977, 3a ed., p.185]

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